Capa | Revista 06 | Revista 07 | Revista 08

MENU


Editorial

Educar Sempre

A Minha Escola

- Crónicas de Aprender -

 

Entrevista

Cartoon

 


 

 

"Recordando..."

Capitolina Pais Ribeiro
 

Pediram-me que recordasse os velhos tempos da Escola. É sempre com muito prazer que o faço e com imensa saudade que relembro esses tempos felizes.

Quando terminei o curso fui para Barbacena onde estive um ano, depois para Terrugem e mais tarde para Vila Boim, onde permaneci vinte e nove anos. Uma vida!...

Era uma festa. A escola nessa altura era um lugar de paz, de ajuda mútua, de amizade entre todos, colegas, funcionários, auxiliares, alunos e suas famílias. Havia boa disposição e entusiasmo, quer no dia-a-dia como na organização de alguma atividade extra curricular. Sempre contámos com a cooperação de todos e com a sua boa vontade, a pensar somente nas crianças que nos eram entregues incondicionalmente pelos pais.

O Professor era considerado o segundo pai e a escola a segunda família. Preparava-se com entusiasmo a primeira comunhão, muitas vezes feita na escola, num salão para isso transformado em capela, sempre fora das horas letivas.

Recordo sempre este ambiente de família. Foi graças à escola, aos alunos e suas famílias que pude enfrentar um grande desgosto na minha vida, acompanhando-me de uma maneira silenciosa naqueles anos difíceis. Os meus alunos foram a minha família mais próxima. Recordo o dia em que voltei à escola; o silêncio era profundo e sentido pelas crianças que pareciam ter crescido de um dia para o outro.

Ainda hoje mantenho essa proximidade com os colegas, ex-alunos; quando nos encontramos é uma festa.

Em caso de dificuldade lá recorro a um que é eletricista, outro que é canalizador, aos polícias, que em vez de me multarem me ficam a guardar o carro. É tão bonito e tão são tudo isto. Sempre solícitos na hora de ajudar a professora.

Recordo o último grupo de quarta classe que tive e com os quais continuei um ano depois de me ter reformado.

Começaram comigo a primeira classe. Tinha um miúdo pequenino que chegava sempre tarde e sem ter tomado o pequeno-almoço. Enquanto ia à cantina comer qualquer coisa eu ia-lhe fazendo as letras no caderno. Um dia fiz um “i” que ele repetiu tão pequenino que, quando ia mostrar-mo, voltava a folha de todos os lados e… acabou por dizer-me com uma cara muito inocente: “Olhe, perdi-o”.

Outro, ao ver a minha pouca habilidade para ilustrar o “U” com um cacho de uvas, diz para as colegas: “Está mal feito, mas a professora já está velhota.” Críticas diretas e inocentes, logo assumidas por quem as tinha feito. Tudo está muito claro na minha mente e é com imensa saudade que recordo inúmeros episódios em que estava sempre presente o espírito da professora, mãe, amiga e confidente dos alunos.

Em todo o lado encontro alunos sempre solícitos para ajudar. As minhas filhas chamam-lhes, com graça, a “máfia” da mãe.

Hoje vejo os colegas tão cansados e desejosos de deixar a escola e pergunto-me como tudo mudou tão de repente. Mudaram-se os valores da sociedade e com eles se arrastou a escola numa perda de hierarquias e numa luta desesperada por alcançar o poder. Passaram vinte e quatro anos e muitas escolas são uma disputa de quem sobe mais alto e onde as pessoas se atropelam umas às outras. Creio que acabou o ambiente de paz, alegria, boa vontade e entreajuda, cedendo o lugar à disputa.